I –A ESQUADRA REAL
Quando, no final do ano de 1807, D. João VI e sua Corte embarcaram para o Brasil, escapando das forças de Napoleão, que se encontravam às portas de Lisboa, fazia parte das naus, que integravam a esquadra portuguesa, a D. João de Castro.
Além dessa, a esquadra era formada pelas naus Martim de Freitas, Príncipe Regente, Medusa, Afonso de Albuquerque, Conde D. Henrique, Príncipe do Brasil, e Rainha de Portugal. Das fragatas Minerva, Urânia e Golfinho. Os Bergantins Condessa de Resende, Lebre, Batão e Furão. E da charrua Tétis.
A Nau D. João de Castro, nesta época, era comandada pelo Capitão de Mar e Guerra Manuel João Loccio. Foi lançada ao mar em 1766, e já não era tão nova. Havia participado de diversas missões da esquadra portuguesa. Com seus 53,33m de comprimento de quilha e 13, 38m de boca, era uma das maiores naus da esquadra. Levava 74 peças de artilharia e uma tripulação de aproximadamente 650 homens.
II – O OFICIAL VITORINO ANTÔNIO JOSÉ GREGÓRIO DE CAMPOS E SUA MULHER, JOANA ROSA DE CAMPOS
– Avós de Bernardino José de Campos Jr.
Vitorino Antônio José Gregório de Campos, tornar-se-ia o patriarca da família de Bernardino José de Campos Jr, no Brasil.
Recém-formado, em Lisboa, pela Real Academia de Marinha, e em matemática, onde se matriculou como voluntário, foi designado para compor o corpo de oficiais da famosa embarcação, que sempre demonstrou bravura nas expedições em defesa de Portugal.
Em novembro de 1807, a Real Esquadra Portuguesa navegava pelo Estreito de Gibraltar, com a missão de proteger a frota mercante dos ataques de piratas, quando o comandante da frota foi surpreendido pelas ordens do Monarca, para que voltasse ao estuário do Tejo e se aprontasse para acompanhar o navio que, por resolução de D. João, levaria seu filho, o herdeiro da Coroa, D. Pedro, para o Brasil.
III – RAZÕES PARA A PARTIDA DA FAMÍLIA REAL PARA O BRASIL
Na verdade, D. João não tinha intenção de mandar seu filho, sozinho, para o Brasil. Com muita discrição, fazia-se os preparativos, a toque de caixa, para transferir para a Brasil grande parte da Corte e fazer do Rio de Janeiro a sede de Governo do Reino.
Ao ser informado, pelos ingleses, de que as tropas francesas se achavam muito próximas de Lisboa, D. João determinou o embarque imediato.
O Príncipe Regente havia, por todos os meios possíveis, tentado conservar a neutralidade. Não queria ver seu povo sofrer os horrores de uma guerra e nem, que Portugal sofresse a humilhação, pela qual passavam os reinos da Europa, principalmente a casa real espanhola, que se via desmoronada nas mãos de Napoleão.
Dom João havia mandado diamantes e dinheiro, para agradar a Napoleão, tentando evitar, que esse invadisse Portugal, mas fora em vão. Sabia, que se Portugal enfrentasse as tropas francesas, teria o mesmo fim da Espanha e de outras nações e. Dona Maria I, e sua dinastia, seria obrigada a renunciar ao trono, e se perderia a posse de todas as terras, duramente conquistadas, por seus antepassados.
ESQUADRA PORTUGUESA – “Batalha do Cabo de S. Vicente”
IV- O EMBARQUE DA FAMÍLIA REAL, COM GRANDE PARTE DE SUA CORTE E PESSOAS DE POSSE
Nau Martim de Freitas
Ainda não haviam sido postas todas as bagagens quando, à tarde, ouviu-se uma salva de 21 tiros, vinda da foz do Tejo. A Esquadra Real respondeu, com outras tantas. Era o sinal que havia sido combinado com o comandante da Armada britânica, Sidney Smith, para que os portugueses levantassem âncoras.
A Nau Martim de Freitas, mais tarde renomeada D. Pedro, foi a primeira a zarpar, liderando, com a Medusa, a Esquadra Real Portuguesa.
Assim, em 29 de novembro de 1807, do porto de Belém, em Lisboa, partiu para o Brasil, a esquadra brasileira, indo ao encontro da Armada Inglesa, que a escoltará até o final da viagem, sob o comando do almirante inglês, Sidney Smith
O Comandante Sidney Smith anotou, em seu livro de quartos, a cena magnífica que se lhe apresentou quando, mais de 60 navios se juntaram na foz do Tejo, sacudidos pelos fortes ventos e seguiram para sua perigosa jornada.
Os navios enfrentaram longas tempestades e a nau D. João de Castro sofreu várias avarias.
Já em território brasileiro, muito danificada, começou a fazer água. Embora toda equipagem tentasse faze-la navegar, o Comandante Manuel João Loccio verificou que a embarcação não aguentaria até o Rio de Janeiro. Estando nas costas da Paraíba, refugiou-se na Enseada de Lucena.
Dois navios que faziam o correio entre Portugal e o Brasil, a charrua Ativo e o navio de praça Imperador Adriano lhes vieram socorrer. Os passageiros e equipagem foram, em segurança, para eles transferidos. Alguns oficiais e marinheiros ficaram para, sob as ordens do capitão, levar a nau para Salvador ou Rio de Janeiro, para reparos definitivos, pois a Enseada de Lucena não tinha condições de fazê-lo.
Vitorino Antônio e sua mulher estavam entre esses, conseguiram chegar a Salvador e daí para o Rio de Janeiro, onde aportaram e passaram a residir. A nau foi para o estaleiro e ainda prestou serviços, sob o comando português, até finais de 1808.
Em 1823, com a independência do Brasil, passou a fazer parte da Armada Brasileira, que durante o segundo reinado, chegou a ser uma das maiores frotas do mundo.
VI – O primeiro brasileiro da família
Em 1810, Vitorino Antônio e Rosa, sua mulher, agora morando no Brasil, navegavam em águas da Bahia, quando Rosa deu à luz Bernardino José de Campos, que viria a ter um filho com seu nome.
Ao aportarem em Salvador, o menino foi levado a batizar na Igreja de Nossa Senhora da Conceição da Praia.
VII – BERNARDINO DE CAMPOS ACADÊMICO DA TERCEIRA TURMA DA FACULDADE DE DIREITO DO LARGO DE SÃO FRANCISCO
Em 1834, Bernardino José de Campos, filho de Vitorino e Rosa, mudou-se para São Paulo e matriculou-se na 3ª turma da recente e já famosa Faculdade de Direito, colando grau em 1838.
AUGUSTO TEIXEIRA DE FREITAS
Em 1835, ali matriculou-se também, vindo da Faculdade de Olinda, o segundo anista, Augusto Teixeira de Freitas, com quem Bernardino desenvolveu uma amizade que durou a vida inteira.
Passaram a estudar juntos o emaranhado da legislação vigente, constante do currículo, que nunca fora codificada, herdada dos portugueses e espanhóis, o que tornava o seu conhecimento uma tortura para os jovens acadêmicos.
Bernardino e Augusto, que tinham em comum o gosto pela ordem e disciplina, procuravam facilitar suas tarefas, classificando a legislação e fazendo anotações que os ajudassem a compreender e guardar o que os mestres lhes passavam, medida que lhes foi muito útil em suas vidas profissionais.
Assim, quando em 1855, Teixeira de Freitas foi contratado pelo governo de D. Pedro II para elaborar uma consolidação de todas as leis vigentes no país, convidou alguns juristas para ajudá-lo na difícil empreitada e, entre eles, o antigo colega da Academia de São Paulo, Bernardino de Campos, o pai.
(Muitos anos mais tarde, seu filho, quando foi reeleito senador em 1900, fez parte da comissão encarregada de estudar o projeto de Código Civil e foi convidado por Rui Barbosa, presidente da Comissão, para dar parecer sobre o capítulo “Direito das Cousas”. Nesse trabalho, publicado em 1902, revela-se a sua cultura geral e especializada, dando ao exame técnico dos institutos da Posse e da Servidão a amplitude de um estudo jurídico-sociológico).
A obra confiada a Teixeira de Freitas era imensa. Ainda estava em vigência no Brasil o antigo Código Filipino, da Espanha, e uma imensidade de leis avulsas, decretos, alvarás, provisões, resoluções que se acumulavam ano após ano, tornando a interpretação do Direito pelos advogados, promotores e juízes uma tarefa ingrata e nem sempre possível de ser aplicada com Justiça.
O trabalho foi realizado, sob a orientação de Teixeira de Freitas, com a maior capacidade e dedicação. Em 1857, o grande jurista pode apresentar ao Imperador uma compilação de quase 5.000 verbetes, que foi publicada em 1858, com o título de “Consolidação das Leis Civis Brasileiras”.
Aproveitando esse magnífico trabalho, em 1859, D, Pedro II incumbiu Teixeira de Freitas de preparar um projeto para o Código Civil.
Mais uma vez Bernardino de Campos se achava entre seus auxiliares.
Já em 1865 foi apresentada ao povo brasileiro, para alívio dos profissionais do Direito, a primeira codificação civil brasileira, que Teixeira de Freitas denominou “Esboço de Código Civil”.
VIII – O CASAMENTO
Autos do casamento de Bernardino de Campos e
Felisbina Rosa Gonçalves
Bernardino de Campos casou-se, em 12 de agosto de 1834, na Igreja da Sé de São Paulo, com Felisbina Rosa Gonsalves, da cidade de Santos, filha de Simão Gonsalves e Maria de Souza.
Formado, foi designado como juiz da cidade de Bragança, onde nasceram seus filhos Américo Brasílio, Amélia Augusta, Carlos Firmino, falecido criança, e Delfica.
IX – TRANSFERÊNCIA PARA POUSO ALEGRE E NASCIMENTO DE BERNARDINO JOSÉ DE CAMPOS JR
De Bragança, o juiz Bernardino de Campos foi transferido para Pouso Alegre, Minas Gerais, onde nasceu seu filho caçula, Bernardino José de Campos Jr, em 6 de setembro de 1841.
Após dois anos em Pouso Alegre, voltou para Campinas e começou a advogar.
Advogado de sucesso, Bernardino de Campos enfrentou o momento mais difícil de sua vida, quando teve de tratar do inventário dos bens de seu genro, que deixou viúva sua filha Amélia Augusta e três filhos pequenos.
Inconformado de ter que entregar parte da herança, que cabia à viúva e filhos e irritado com o advogado, que tratava da causa, um dos membros da família contratou o pistoleiro Bento José dos Santos, que matou a tiros Bernardino de Campos, quando esse saía de um espetáculo no Teatro de Campinas, no dia da Festa de Santos Reis de 1864. Tinha 58 anos.
Américo e Bernardino, que idolatravam o pai, ficaram desesperados.
Certa noite, com mais alguns amigos, montaram em seus cavalos e, com tochas acesas, partiram para a fazenda do mandante do crime e puseram fogo nas plantações.
Mais tarde, prendeu-se o pistoleiro, Bento, que confessou as circunstâncias do crime.
Bernardino, ainda muito jovem, recém-formado, com 23 anos, trabalhava com o pai. Era alegre e feliz.
Mas após aquela tragédia, tornou-se sério, mesmo melancólico e por toda a vida, quando se lembrava do pai, via-se brilharem lágrimas contidas em seu doce olhar.
X – PÁGINA DO DIÁRIO DE BENTO BUENO, SECRETÁRIO DO INTERIOR E JUSTIÇA DO PRESIDENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO, BERNARDINO DE CAMPOS
Blog – Dr. Bento Bueno – Notas de Política e Conversas 1923-1954
Administrador: Bento Bueno.
1942 – julho, 21.
“Certo dia, quando eu era Secretário do Interior e Justiça do governo do dr. Bernardino, tendo eu e ele assinado grande número de títulos de nomeações de autoridades, ele me disse de repente, fitando as minhas assinaturas espalhadas sobre a mesa: “Bento! Sempre odiei esse nome; mas você já me reconciliou com ele. “Meio comovido, agradeci, mas não ousei perguntar nada. E iria pra minha cova, lembrando-me sempre daquela demonstração de estima e ignorando sempre o motivo daquele ódio, se, abrindo neste momento o “Estado de São Paulo”, de hoje, não deparasse com esta efeméride do dia: “1869 – é preso na vila de Jahú e remetido para a cidade de Campinas, Bento José dos Santos, assassino do Dr. Bernardino José de Campos”.
XI – O ASSASSINO DE BERNARDINO DE CAMPOS (pai).
Para arrematar a história desse assassinato, Mário de Campos, um dos dezesseis filhos de Bernardino de Campos Jr, e que era engenheiro da estrada de ferro Mogiana, contava um curioso acontecimento.
Estava hospedado em uma pequena cidade de Minas Gerais, para implantação de trilhos da ferrovia, quando, certo dia, um homem o procurou e perguntou se era ele o filho do Dr. Bernardino de Campos Jr.
Confirmado, o senhor lhe pediu um favor: Que fosse à casa de um pobre moribundo que, ao saber, que um parente de Bernardino de Campos Jr estava na cidade, pedia muito que queria falar com ele. Mario de Campos, pessoa caridosa ao extremo, foi de imediato ver o homem. Chegou a um lugar de muita pobreza onde, deitado em um catre, estava um pobre velho doente. Com grande aflição, o homem lhe contou, que seu nome era Bento e que fora ele o assassino de seu avô e que tinha um grande remorso e arrependimento do que tinha feito, a pedido do mandante, conhecido fazendeiro.
O pobre Bento suplicou, que seu neto Mario e toda a família o perdoasse, por seu crime. Logicamente foi perdoado e Mário nunca se esqueceu desta história incrível.
Esquadra Portuguesa – Batalha de São Vicente
Esquadra Portuguesa - Batalha de São Vicente
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Maria Sylvia Nogueira de Toledo
A autora e editora do portal Maria Sylvia Nogueira de Toledo, Procuradora do Município de São Paulo, (1936), aposentada, não é historiadora. Contudo, verificou que em algumas publicações, sobre a vida de seus antepassados – importantes personagens da História do Brasil – havia algumas lacunas e, até mesmo inverdades, o que a levou a publicar esse Portal, para além de esclarecer alguns equívocos, pudesse registrar momentos importantes de nossa História.
Além de fazer pesquisas, em livros, jornais, documentos, museus, acrescentou diversos relatos ouvidos de seus familiares, que não fazem parte da historiografia.