As Arcadas
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I – BERNARDINO DE CAMPOS (pai), AMÉRICO BRASÍLIO DE CAMPOS E BERNARDINO DE CAMPOS JR, NAS ARCADAS – 1834/1838, 1865/1860 e 1858/1863.
Em 1834, Bernardino José de Campos, filho do oficial da marinha portuguesa, Vitorino Antônio José Gregório de Campos e de Joana Rosa de Campos, matriculou-se na 3ª turma da recente e já famosa Faculdade de Direito, colando grau em 1838.
2 – AUGUSTO TEIXEIRA DE FREITAS
Em 1835, ali matriculou-se também, vindo da Faculdade de Olinda, o segundo anista, Augusto Teixeira de Freitas, com quem Bernardino desenvolveu uma amizade que durou a vida inteira.
Passaram a estudar juntos o emaranhado da legislação vigente, constante do currículo, que nunca fora codificada, herdada dos portugueses e espanhóis, o que tornava o seu conhecimento uma tortura para os jovens acadêmicos.
Bernardino e Augusto, que tinham em comum o gosto pela ordem e disciplina, procuravam facilitar suas tarefas, classificando a legislação e fazendo anotações, que os ajudassem a compreender e guardar o que os mestres lhes passavam, medida que lhes foi muito útil em suas vidas profissionais.
Assim, quando em 1855, Teixeira de Freitas foi contratado pelo governo de D. Pedro II, para elaborar uma consolidação de todas as leis vigentes no país, convidou alguns juristas para ajudá-lo na difícil empreitada e, entre eles, o antigo colega da Academia de São Paulo, Bernardino de Campos, o pai.
Muitos anos mais tarde, seu filho, Bernardino de Campos Jr, quando foi reeleito senador em 1900, fez parte da comissão parlamentar encarregada de estudar o projeto de Código Civil e foi convidado por Rui Barbosa, presidente da Comissão, para dar parecer sobre o capítulo “Direito das Cousas”. Nesse trabalho, publicado em 1902, revela-se a sua cultura geral e especializada, dando ao exame técnico dos institutos da Posse e da Servidão a amplitude de um estudo jurídico-sociológico.
A obra confiada a Teixeira de Freitas era imensa.
Ainda estava em vigência, no Brasil, o antigo Código Filipino, da Espanha, e uma imensidade de leis avulsas, decretos, alvarás, provisões, resoluções, que se acumulavam ano após ano, tornando a interpretação do Direito pelos advogados, promotores e juízes uma tarefa ingrata e nem sempre possível de ser aplicada com Justiça.
O trabalho foi realizado, sob a orientação de Teixeira de Freitas, com a maior capacidade e dedicação. Em 1857, o grande jurista pode apresentar ao Imperador uma compilação de quase 5.000 verbetes, que foi publicada em 1858, com o título de “Consolidação das Leis Civis Brasileiras”.
Aproveitando esse magnífico trabalho, em 1859, D. Pedro II incumbiu Teixeira de Freitas de preparar um projeto para o Código Civil.
Mais uma vez Bernardino de Campos (pai) se achava entre seus auxiliares, mas sua prematura morte, em uma emboscada, armada por um desafeto, impediu-o de continuar colaborando em tão grandiosa obra.
Só 1865, foi apresentada ao povo brasileiro, para alívio dos profissionais do Direito, a primeira codificação civil brasileira, que Teixeira de Freitas denominou “Esboço de Código Civil”.
3 – BERNARDINO JOSÉ DE CAMPOS E SUA FAMÍLIA, EM CAMPINAS
Por volta de 1843, Bernardino José de Campos pediu exoneração da carreira de juiz em Pouso Alegre e abriu uma banca, para advogar em Campinas. Seus filhos Américo, Bernardino, Amélia e Delfica ali cresceram e estudaram as primeiras letras. (Nota 2)
Campinas, a esse tempo, deixara de ser considerada uma Vila e, há pouco, passara à categoria de cidade.
Américo, Bernardino e suas irmãs eram acompanhados em seus estudos, pelo pai. O que mais gostavam era, após completadas as lições, os quatro sentarem-se no chão, aos seus pés, com ele na cadeira de vime, para ouvirem suas histórias de vida, principalmente quando se tratava de sua passagem pela Faculdade de Direito de São Paulo, como aluno da terceira turma, que ali se matriculara.
Contava-lhes o pai, como se lembrava do alvoroço que fora quando, em uma das salas da Faculdade, a mulher de seu colega Inácio Manoel Álvares de Azevedo, ao ir encontrar o marido na saída das aulas, sentira repentinamente as dores do parto e dera, ali mesmo, em uma de suas salas, à luz, o futuro poeta, Álvares de Azevedo.
Os meninos achavam graça e ouviam, com prazer, o pai ler as poesias do festejado gênio, tão popular, que, de tão repetidas, chegavam a decorar.
Contava, também, como os acadêmicos de Direito cultivavam o Civismo e a Liberdade e como execravam o sistema, que acolhia uma legislação, que permitia a exploração do braço escravizado.
Com essas narrativas, Bernardino ia assim ensinando seus filhos os princípios da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, adotados pelos revolucionários da França de 1779, aconselhando-os a nunca aceitar a escravidão e a lutar pela Abolição do povo, vergonhosamente escravizado.
A influência do pai advogado foi grande, na vida dos filhos.
Seguindo as pegadas do pai, Américo e Bernardino também se prepararam para ingressar na famosa Faculdade do Largo de São Francisco.
4 – AMÉRICO BRASÍLIO DE CAMPOS
Em1855, Américo Brasílio de Campos, o filho mais velho, foi para São Paulo e matriculou-se na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco.
Foi aí, que sua verdadeira vocação aflorou. Pouco se empenhou no estudo do Direito, mas sim com a filosofia, a política, o teatro, a música e em escrever folhetins, para leitura dos colegas.
Para se sustentar, dava aulas de gramática, francês, latim e o que mais aparecesse, pois tinha uma sólida cultura, pelo gosto que tinha pela leitura. Logo que chegou a São Paulo, dirigiu-se à redação do Jornal “O Correio Paulistano”, fundado pelo decano dos jornalistas paulistas, José Roberto de Azevedo Marques.
JOAQUIM ROBERTO DE AZEVEDO MARQUES
Azevedo Marques mantinha boas relações com os campineiros e conhecia a família de Américo.
Seria, no futuro, sogro de seu amigo de infância Francisco Quirino dos Santos. Sentiu, assim, certa liberdade para lhe pedir emprego no jornal.
Foi no Correio Paulistano que iniciou a sua brilhante carreira jornalística, sob a tutela do bom Azevedo Marques e do redator do jornal, o experiente e culto Pedro Taques de Almeida Alvim, também formado, em 1853, nas Arcadas.
Pedro Taques de Almeida Alvim
Pedro Taques, ao deixar de ser redator do Correio Paulistano, para fundar “O Diário de São Paulo”, deixou em seu lugar Américo de Campos.
Américo, boêmio e de temperamento mais descontraído, gostava de discussões polêmicas. Não se incomodava muito com seus trajes e, friorento, trazia sempre um xale em seus ombros e uma fruta no bolso, para mordiscar a qualquer hora.
Não se aprofundou nos estudos do Direito, pois seu tempo era mais dedicado a escrever artigos para os folhetins que se publicavam na faculdade e até peças de teatro, como a comédia, em um ato, “O Concílio das Comadres”, que foi encenada para o povo paulista, com certo sucesso.
Sua paixão, porém, era a música, que, em criança, estudara com o mestre de capela Maestro Manoel José Gomes, pai de Carlos Gomes, em Campinas. Os dois meninos cantavam juntos, no coro da Matriz Velha, o que solidificou uma amizade que durou a vida inteira.
Antônio Carlos Gomes
Antonio Carlos Gomes, também nessa época, viera estudar música e fazer algumas apresentações, em São Paulo e frequentava, junto com Américo, a mesma república dos estudantes de Direito.
Com isso, desenvolveu uma grande amizade com os acadêmicos, adotando seus ideais. A convivência lhe inspirou a compor o “Hino Acadêmico”, cujos acordes causam sempre emoção, até hoje, a todos alunos, professores e funcionários que ali convivem, como causou aos que ali conviveram.
As lembranças da bandeira da Abolição, levantada pelos estudantes, também o levaria a compor uma de suas mais conhecidas Óperas, “Lo Schiavo”. Formado, Américo de Campos foi para Itu, como promotor, onde também estudava música, sob a orientação do Maestro Elias Lobo.
5 – BERNARDINO JOSÉ DE CAMPOS JR
Bernardino, esguio, alto, sempre elegante, os gestos sóbrios. Alegre e muito estudioso, gostava de ler os filósofos, que influenciaram a explosão da Revolução Francesa, e sempre levava um livro consigo, aonde quer que fosse.
Em aulas administradas pelos mestres das Arcadas, tivera seus primeiros contatos com as diversas teorias sociais como as de Rousseau, Spencer e Kant, com os conceitos impressos na Constituição da América do Norte, com os princípios adotados pela Revolução Francesa de 1789, e com o exemplo de governos exercidos nas recentes Repúblicas da América Latina, principalmente na Argentina.
Mas, a teoria que mais encetava debates sem fim, era a novidade trazida da França, conhecida como Positivismo.
As ideias de seu criador, Auguste Comte, incendiaram o pensamento dos estudiosos, no Brasil, que as adotavam como um caminho para transformar a sociedade, com base em um sistema de governo democrático.
Os princípios do Positivismo tinham como método de estudo chegar ao conhecimento, investigando os fatos da existência. A meta era o estudo, a ilustração, o conhecimento científico.
Para Bernardino, a doutrina positivista caiu como uma luva.
A sua generosidade, o amor pelo próximo, que o levava a abominar a escravidão, o desejo do conhecimento, que lhe trazia a convicção de que todas as pessoas deveriam ter a oportunidade de alcança-lo e adotando para si mesmo a ordem, em sua vida pessoal, para atingir seus objetivos, o levou a estudar com profundidade a doutrina, com a qual encontrou grande afinidade.
Contudo, de acordo com sua índole, onde predominava o bom senso e a reflexão, não acompanhou, mais tarde, o comportamento dos pensadores ortodoxos da doutrina, que levou o Marechal Deodoro a dissolver a Assembleia, para tornar-se um ditador.
Bernardino não aprovava que o exército exercesse o Poder Executivo, mas quando o partido republicano, em sua maioria, elegeu o Marechal Deodoro para ser o primeiro presidente da República e Floriano Peixoto como vice, sua fidelidade partidária aceitou a decisão da maioria.
6 – A VIDA ACADÊMICA
Pelas Arcadas, já haviam passado outros acadêmicos, que tinham como tradição abraçarem as causas que afligiam o povo brasileiro, procurando achar soluções, dentro do estudo do Direito.
Como em uma corrida de revezamento, cada geração passava à outra, mais jovem, esse costume dos acadêmicos de se envolverem em debates filosóficos e políticos, pelo desejo de sempre contribuírem pelo desenvolvimento e aprimoramento da sociedade e da Nação.
Mais do que o estudo de Direito, Américo e o irmão Bernardino, se interessavam pelas discussões políticas, sociais e filosóficas, que eram travadas no pátio da famosas Arcadas e se prolongavam no Largo de São Francisco e nas salas das Repúblicas.
Que momentos inesquecíveis viviam aqueles moços, cheios de ideais e sonhos, quando nos intervalos das aulas, ou mais tarde, reunidos sob as tênues luzes dos lampiões, no Largo de São Francisco ou nas “repúblicas” onde moravam, discutiam, horas a fio, qual seria a melhor forma de governo para o Brasil.
Tomavam partido, em discussões intermináveis, sobre as diferentes posições políticas, dos Liberais e dos Conservadores.
A eles se juntavam os monarquistas, conservadores ou liberais, formando grupos, onde turbilhões de novas ideias surgiam, fortalecendo convicções e pensamentos, que os acompanhariam por toda vida.
Nunca mais se veria um grupo de estudantes tão unidos e destinados a tão altos desígnios, a tão revolucionários propósitos.
Naquele solo privilegiado, se encontravam, geração após geração, aqueles jovens, que, mais tarde, com destemor, mudariam os destinos do Brasil.
Na época em que Bernardino e Américo ali estudavam, cursaram também as aulas de Direito, entre muitos outros, Manoel Ferraz de Campos Sales, Prudente de Moraes, Francisco Glicério, José Pinto do Carmo Cintra, Jorge Ludgero de Cerqueira Miranda, Afonso Celso de Assis Figueiredo, José Alves de Cerqueira Cesar, Salvador Mendonça, companheiros para toda a vida.
7 – LUIZ CONZAGA PINTO DA GAMA
Entre eles encontrava-se um simpático rapaz, dono de uma verve especial, espirituoso, irônico, crítico mordaz, que se juntava à ala abolicionista, dando-lhe razões fáticas de porque não se podia tolerar a escravidão.
Suas palavras tinham o dom de convencer uma boa parte dos estudantes, pois era o fruto dessa ignominia aceita por grande parte dos brasileiros, mesmo por aqueles que achavam errado ainda sua existência no país, mas não faziam nada para aboli-la.
Chamava-se Luiz Gonzaga Pinto da Gama.
Após as aulas, os alunos concentravam-se à roda dele, para ouvir suas histórias e os planos de luta para libertar os cativos. Frequentava as “repúblicas”, onde as discussões e os pontos de vista varavam a noite.
Não era um aluno comum. Embora portador de grande inteligência, pela situação esdrúxula de ter nascido livre, mas ter sido vendido como escravo pelo próprio pai, só lhe foi possível alfabetizar-se aos dezesseis anos e por apenas um ano, pela generosidade de um amigo.
Com mais idade, entendeu que não poderia ser obrigado a servir ao homem para o qual fora vendido e fugiu, da fazenda onde vivia, para São Paulo.
Alistou-se na Força Pública da Província, mas ao conhecer a Faculdade do Largo de São Francisco, sua meta passou a ser a de estudar Direito.
Queria ser advogado, para defender seu povo, que sofria as maiores injúrias, sem alguém, que se dignasse a socorrê-lo.
Tentou matricular-se, mas, infelizmente, não possuía a formação escolar necessária para isto, que era a de conhecer bem, além do português, o latim, francês e inglês. Há muito pouco tempo, que aprendera apenas a ler e escrever.
Mas isto não o esmoreceu. Pediu que o aceitassem apenas como ouvinte, e assim, cursou brilhantemente a Academia, frequentando assiduamente as aulas e sua rica biblioteca, por muitos anos, até absorver todos os ensinamentos necessários à sua formação, e fazendo-se amigo de muitos acadêmicos, por diversas turmas.
Usando de sua brilhante inteligência e de uma vontade férrea, tornou-se um autodidata, culto e talentoso.
Naquele território, que foi frequentado pelos maiores abolicionistas do país, não foi, como dizem, por discriminação, que não aceitaram sua matrícula, mas por razões de não possuir o conhecimento das matérias exigidas para acompanhar o curso, constante da lei que criou os Cursos Jurídicos, em 11 de agosto de 1827.
Seus maiores amigos, com quem tinha mais afinidade, apesar de ser um pouco mais velho do que eles, foram os irmãos Américo e Bernardino de Campos, com os quais, depois de formados, fez política, praticou ações abolicionistas, jornalismo e a propaganda republicana.
8 – AS TESES EM DISCUSSÃO – REPÚBLICA E ABOLIÇÃO
As teses preferidas nas discussões acadêmicas eram sobre as vantagens do sistema Republicano de governo e a vergonha de, no Brasil, ainda se manter, legalmente, homens escravizados.
Cultuavam os princípios da Igualdade e da Legalidade.
Muitos ali se sentiam inclinados a continuar as lutas iniciadas pelos antigos acadêmicos José Bonifácio de Andrade e Silva, Líbero Badaró, Teófilo Ottoni, Francisco Otaviano, Saldanha Marinho, José Antônio Saraiva,
Quando a discussão tinha como tema a escravatura, Bernardino e Américo inflamavam-se e, aqueles moços educados, conciliadores, calmos, se tornavam intransigentes defensores da abolição total e imediata dos homens, vergonhosamente, mantidos escravizados, com cumplicidade da melhor sociedade e da igreja, pela força da lei e do governo.
Seguiam, com entusiasmo, as atitudes de Zacarias de Góis, Silveira da Mota e tantos outros, que se empenharam a vida inteira, para fortalecer os ideais do Partido Liberal, de derrubar o pensamento retrógrado do Partido Conservador, almejando uma revolução pacífica, onde imperasse a Liberdade de todo povo.
Este sonho sempre esteve muito próximo do povo brasileiro e não foram poucos os que lutaram, foram aprisionados e mortos, por este ideal, e o teriam alcançado, como já dizia o poeta do Partido Liberal, no tempo do Império, Francisco Otaviano, “se a Política não fosse uma Messalina impura”.
Mas a discussão mais apaixonada mesmo, se dava quando vinha à tona a questão de quais os caminhos a tomar, para a total abolição do trabalho escravo.
Era o assunto mais debatido e quase a totalidade dos estudantes concordavam de que, por questões de Justiça, de Moral, de Humanidade, de Direito e de tudo aquilo que eles aprendiam nas salas da Faculdade, deveria ser dada a Liberdade total e imediata, a essa gente tão sofrida.
Os poucos, que se opunham, eram os filhos de fazendeiros, principalmente os que vinham do Vale do Paraíba.
Os que possuíam fazendas, na zona oeste paulista, como Manoel Ferraz de Campos Sales, Prudente de Moraes, Francisco Glicério, achavam que a escravidão deveria ir se acabando paulatinamente, sem violência, pois não havia mais tráfico e, com a liberdade dos nascituros e a Lei dos Sexagenários, mais dia, menos dia, se daria a total extinção da vergonhosa prática.
Mesmos estes, mais tarde, acatando os apelos dos demais integrantes do Partido Republicano Paulista, do qual seriam os fundadores, agregaram-se à causa Abolicionista.
“Não se faz uma República mantendo-se o braço escravo”, clamará Bernardino, com veemência e convicção, na famosa Convenção de Itu, onde tentará convencer os poucos escravocratas, que restavam, a abraçar a causa da Abolição.
Tornava, como suas, as palavras de José Bonifácio de Andrada e Silva, nos idos de 1823, que como membro da Assembleia Constituinte do Império, bradara revoltado: “Mas como poderá haver uma Constituição liberal, duradoura e verdadeira, em um país, como o Brasil, habitado por uma multidão imensa de escravos?”
Entre os mais entusiasmados defensores dessa causa, filiavam-se, além dos irmãos Américo e Bernardino de Campos, os estudantes José Pinto do Carmo Cintra, cujo pai seria mais tarde agraciado com o título de Barão de Campinas; Afonso Celso de Assis Figueiredo, futuro Visconde de Ouro Preto, monarquista liberal, mas ferrenho defensor da Abolição; José Alves de Cerqueira Cesar, que seria um dos subscritores do Manifesto Republicano de 1870 e que, nos mesmos passos de Bernardino de Campos, também seria secretário e presidente do Partido Republicano Paulista e Presidente da Província de São Paulo; Flávio Farnese, um dos redatores do primeiro jornal republicano, fundado por Quintino Bocaiuva, “A República”.
O grupo da Faculdade, mesmo seguindo caminhos diferentes, uns com um comportamento mais revolucionário, outros mais conservadores e outros ainda mais prudentes, a espera de uma oportunidade, para que se fizesse a mudança de regime da maneira mais pacífica possível, seriam os maiores propagandistas republicanos.
Discípulos de Saldanha Marinho, Quintino Bocaiuva e Benjamim Constant, após a proclamação, seriam os líderes de sustentação do novo regime.
Esse grupo divergia em muitos pontos, onde o mais polêmico era se à causa republicana, deveria se juntar a causa da abolição da escravatura.
A maioria concordava com a necessidade de uma mudança no sistema de governo, antes de tudo. A Abolição viria como consequência.
Nesse ponto, começavam as discórdias dos companheiros com os irmãos Américo e Bernardino e outros, como Luiz Gama, que insistiam na incoerência de uma República ser implantada em um país que explorasse o braço escravo, sistema de governo, que tinha como princípios, a Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade.
Os estudantes tinham por costume acompanhar o desenrolar dos acontecimentos na Corte e como se desenrolava a propaganda republicana.
Ao se formarem, levavam consigo o desejo de criar uma nação.
9 – Américo Brasiliense de Almeida Melo
Em 1860, os alunos da Faculdade do Largo de São Francisco assistiram, com orgulho, o jovem advogado Américo Brasiliense de Almeida Melo, formado a apenas cinco anos naquela Faculdade, defender sua tese com brilhantismo e obter o primeiro lugar no concurso que lhe concedeu o título de doutor, com a nomeação para professor de Direito na Escola que tanto amavam.
Américo Brasiliense vinha engrossar a fileira de propagandistas da República e da Abolição, no âmbito dos catedráticos das Arcadas.
No futuro se tornaria, sem nunca ter abandonado sua cátedra, vereador, deputado providencial e da Assembleia Geral, nomeado, no Império, como Presidente das Províncias da Paraíba e do Rio de Janeiro, advogado em Campinas, sempre como forte propagandista da República e da Abolição, seria um dos fundadores do Partido Republicano.
Com o advento da República, seria nomeado pela Assembleia, o primeiro presidente, do agora Estado de São Paulo, proclamando sua Constituição.
No entanto, alguns anos depois, os republicanos históricos se afastaram de Américo Brasiliense de Melo, por este ter ficado ao lado do Marechal Deodoro, que governava como um ditador, em confronto com os princípios republicanos da Legalidade e Liberdade.
10 – O FUTURO DOS ALUNOS
Sem imaginarem, os alunos e professores da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, conviviam, naquele tempo, com os futuros construtores da República, dentre os quais os primeiros Presidentes civis: Prudente de Morais, Campos Sales, Rodrigues Alves.
Ali também, encontravam-se aqueles que ocupariam a presidência do Estado de São Paulo: Prudente de Moraes, Jorge Tibiriçá Piratininga, Américo Brasiliense, Bernardino de Campos, Cerqueira Cesar, como presidentes nomeados pela assembleia ou pelo Governo Central.
Bernardino de Campos Jr, governou novamente, desta vez como o primeiro Presidente do Estado de São Paulo, eleito pelo voto popular, em 21 de maio de 1902.
A ele, se seguiram, como Presidentes do Estado, os também acadêmicos Joaquim Tibiriçá Piratininga (por duas vezes), Manoel Joaquim de Albuquerque Lins, Rodrigues Alves (duas vezes) e, bem mais tarde, Altino Arantes, Washington Luiz, Carlos de Campos, Antônio Dino da Costa Bueno, Júlio Prestes.
E ainda, Jânio da Silva Quadros, Carvalho Pinto, André Franco Montoro, Claudio Lembo.
11 – O CAIFÁS
Enquanto Bernardino e Américo de Campos, Campos Sales, Francisco Glicério, Francisco Quirino, conversavam e debatiam suas ideias progressistas, na noite friorenta de São Paulo, sob a luz bruxuleante do lampião do Largo de São Francisco, podia-se ver um moço muito magro, enrolado em um casacão preto, a barba mal despontando, que se aproximava timidamente, para ouvir com admiração o que diziam os estudantes e arquitetando sonhos de que um dia estaria também, como eles, ali naquele lugar, para expor aquelas mesmas ideias, que apaixonadamente já adotara.
Era o filho do farmacêutico, ali da botica da Líbero Badaró que, em 1864, se matricularia na famosa Faculdade e dali sairia como o mais combativo dos abolicionistas, companheiro de Luiz Gama e criador da Ordem dos Caifases, Antônio Bento de Souza e Castro.
Nota 1 – Por volta de 1843, Bernardino José de Campos pediu exoneração da carreira de juiz em Pouso Alegre e abriu uma banca, para advogar em Campinas. Seus filhos Américo, Bernardino, Amélia e Delfica ali cresceram e estudaram as primeiras letras.
Nota 2 – Alguns estudiosos da história de Campinas, baseados em uma informação da “A Gazeta de Campinas”, contam que Bernardino de Campos, Bento Quirino dos Santos, Manuel Ferraz de Campos Salles, entre outros, estudaram, inicialmente, no colégio São João Batista, do Professor João Batista Pupo de Moraes, na fazenda Laranjal, hoje Joaquim Egídio. Contudo, a pesquisa não parece precisa, já que este colégio só passou a receber alunos do sexo masculino, em 1862, quando os citados campineiros, à essa época, já eram crescidos e frequentavam a Faculdade de Direito em São Paulo.
Muito bom o site! Textos interessantes sobre personagens importantes da nossa história, que precisa ser melhor compreendida. Gostei também de perceber relações entre personagens e fatos, que muitas vezes podem parecer desconectados.
beijos
Paula
Sem dúvida, Paula Morelli. É esse o intuito de ter me proposto a criar este Portal.
Parabéns, são riquíssimas as descrições dos fatos históricos. Material de extremo valor, resumido, muito bem cadenciado. Gratíssimo
Caro Marco Rossi. Agradecida pela sua manifestação, que me incentiva a continuar a postar mais conteúdo a esse portal.
Que prazer de ver meu bisavô Antônio Bento de Souza e Castro sendo aqui homenageado.
Sou autor da primeira biografia do meu bisavô, se as Arcadas quiserem posso doar uma.
Sem dúvida, seria muito importante, que figurasse entre o magnífico acervo da Faculdade do Largo de São Francisco, a biografia de Antônio Bento de Souza e Castro, para que as novas gerações não esqueçam um dos mais importantes dos abolicionistas históricos, valente, guerreiro, que arriscava sua vida para que se fizesse Justiça e se respeitasse o Direito à Liberdade de um povo escravizado.